Filosofia

Filosofia
"amor à sabedoria"

Poema sobre amizade

Pode ser que um dia deixemos de nos falar...
Mas, enquanto houver amizade,
Faremos as pazes de novo.
Pode ser que um dia o tempo passe...
Mas, se a amizade permanecer,
Um de outro se há-de lembrar.
Pode ser que um dia nos afastemos...
Mas, se formos amigos de verdade,
A amizade nos reaproximará.
Pode ser que um dia não mais existamos...
Mas, se ainda sobrar amizade,
Nasceremos de novo, um para o outro.
Pode ser que um dia tudo acabe...
Mas, com a amizade construiremos tudo novamente,
Cada vez de forma diferente.
Sendo único e inesquecível cada momento
Que juntos viveremos e nos lembraremos para sempre.
Há duas formas para viver a sua vida:
Uma é acreditar que não existe milagre.
A outra é acreditar que todas as coisas são um milagre.
Albert Einstein

segunda-feira, 10 de março de 2008


FILOSOFIA

A Incansável Busca Pela Sabedoria

A palavra Filosofia deriva do grego "PHILOSOPHIA"
SOPHIA significa SABEDORIA
PHILO significa "Amor Filial", ou Amizade
Literalmente, um Filósofo é um AMIGO, ou AMANTE de SOPHIA, alguém que admira e busca a SABEDORIA
Esse termo foi usado pela primeira vez pelo famoso Filósofo Grego PITÁGORAS por volta do século V aC, ao responder a um de seus discípulos que ele não era um "Sábio", mas apenas alguém que amava a Sabedoria.
Filosofia é então a busca pelo conhecimento último e primordial, a Sabedoria Total.
Embora de um modo ou de outro o Ser Humano sempre tenha exercido seus dons filosóficos, a Filosofia Ocidental como um campo de conhecimento coeso e estabelecido, surge na Grécia Antiga com a figura de TALES de MILETO, que foi o primeiro a buscar uma explicação para os fenômenos da natureza usando a Razão e não os Mitos, como era de costume.
Assim como a Religião, ela também já teve sua morte decretada. No entanto a Filosofia Ocidental perdura há mais de 2.500 anos, tendo sido a Mãe de quase todas as Ciências. Psicologia, Antropologia, História, Física, Astronomia e praticamente qualquer outra derivam direta ou indiretamente da Filosofia. Entretando as "filhas" ciências se ocupam de objetos de estudo específicos, e a "Mãe" se ocupa do "Todo", da totalidade do real.
Nada escapa à investigação filosófica. A amplitude de seu objeto de estudo é tão vasta, que foge a compreensão de muitas pessoas, que chegam a pensar ser a Filosofia uma atividade inútil. Além disso seu significado também é muito distorcido no conhecimento popular, que muitas vezes a reduz a qualquer conjunto simplório de idéias específicas, as "filosofias de vida", ou basicamente a um exercício poético.
Entretanto como sendo praticamente o ponto de partida de todo o conhecimento humano organizado, a Filosofia estudou tudo o que pôde, estimulando e produzindo os mais vastos campos do saber, mas diferente da Ciência, a Filosofia não é empírica, ou seja, não faz Experiências. Mesmo por que geralmente seus objetos de estudo não são acessíveis ao Empirismo.

A RAZÃO e a INTUIÇÃO são as principais ferramentas da Filosofia, que tem como fundamento a contemplação, o deslumbramento pela realidade, a vontade de conhecer, e como método primordial a rigorosidade do raciocínio, para atingir a estruturação do pensamento e a organização do saber.

Academicamente, a Filosofia é dividida em: ANTIGA - do século VI aC até VI dC

Foi a era dos pré-socráticos, os filósofos da natureza, os Atomistas, os sofistas, de Pitágoras, Sócrates, Platão, Aristóteles, Plotino e etc. Esses filósofos simplesmente construíram toda a estrutura de nosso conhecimento. Tudo o que temos hoje deve-se ao progresso promovido pelos gregos antigos, ainda que a maior parte dele tenha permanecido adormecido por mil anos. O Universo foi a principal preocupação nesta época.

MEDIEVAL - do século II dC até XV dC

A era da Filosofia Cristã, da Teologia Revelada, da tradição escolástica. A preocupação principal dos filósofos era Deus. Alguns deles foram canonizados, como Santo Agostinho e São Tomás de Aquino. Surge a Navalha de Guilherme de Occam, que mais tarde viria a ser a ferramente básica da Ciência.

MODERNA- do século XVII aC até XIX dC

Surge junto com o Renascimento e o despertar científico, que recupera a sabedoria da Grécia Antiga. O Racionalismo Cartesiano, o Empirismo, o retorno do Ceticismo e muitos outros movimentos deram impulso a Ciência. Descartes imortalizou o "Penso Logo Existo" como um ponto de partida para a construção de um conhecimento seguro. Mais tarde Karl Marx lança as bases do Socialismo, e Adam Smith estrutura o Capitalismo. O enfoque de aí em diante se centrou no Ser Humano e suas possibilidades.

CONTEMPORÂNEA- do XIX dC até...

Os novos desafios no mundo atual surgem sob a forma da Emancipação Feminina, o rompimento definitivo dos Governos com as Igrejas Cristãs, o Existencialismo, a ênfase na Linguística, e mais recentemente o Estruturalismo e o Desconstrutivismo. Alguns nomes já se imortalizaram, como Sartre, Simone de Beauvoir ou Michael Foucalt.

E A FILOSOFIA ORIENTAL?

Embora não seja aceita como Filosofia pela maior parte dos acadêmicos, o pensamento produzido no Oriente, especificamente na China e Índia por Budistas e Hinduístas, possui algumas qualidades equivalentes a da Filosofia Ocidental.
A questão é basicamente a definição do que vem a ser a Filosofia e suas características principais, que da maneira como é colocada pelos acadêmicos ocidentais de fato exclui a Filosofia Oriental. Mas nada impede que se considere Filosofia num conceito mais amplo.
Sem dúvida a Filosofia Oriental é mais Intuitiva que a Ocidental, e menos Racional, o que contribui para sua inclinação mística e hermética. Mas não se pode negar os paralelos que esta possui principalmente com a Filosofia Antiga.
Ambas surgiram por volta do século VI aC, tratando de temas muito semelhantes e há de se considerar que Grécia e Índia não são tão distantes uma da outra a ponto de inviabilizar um contato.
Mesmo assim, a grande maioria dos estudiosos considera que não há qualquer relação entre os Pré-Socráticos e os filósofos Orientais. O que na realidade, pouco importa.
O fato é que assim como Ciência, a Arte e a Mística, a Filosofia sempre existiu em forma latente no ser humano. Nós sempre pensamos. Logo existimos.

A CRISE DA FILOSOFIA

Atualmente, a Filosofia passa por uma fase de perda de identidade. O principal motivo disto é a atual soberania da Ciência. Tal como a Religião já fora o expoente máximo em um passado, onde todos procuravam se aproximar do estatuto da autoridade religiosa, na atualidade a área do conhecimento humano mais destacada é a Ciência. Isso faz com que muitos filósofos prefiram se identificar como cientistas.
Basicamente todas as "Ciências Humanas" que conhecemos são Filosofia. História, Sociologia, Psicologia, Antropologia, Direito, Política e etc. Porém todas parecem querer gozar do prestígio da Ciência, tentando aparentar em sua essência uma característica de "científicamente estabelecido", o que garantiria uma maior aparência de confiabilidade.

FILOSOFIA e CIÊNCIA compartilham uma de suas bases, a RAZÃO, e nesse ponto se misturam, mas não compartilham o EMPIRISMO, que é a outra base da Ciência.
A confusão com relação a definição de Filosofia, e a desinformação geral, que permeia mesmo o meio acadêmico, chega a ponto de permitir o surgimento de propostas quiméricas no sentido de se eliminar a Filosofia.
Entretanto, Ciência alguma pode se ocupar com a Macro Realidade. O Empirismo não pode ser aplicado à Civilização Humana, à Mente, ao Total. Quem estabelece a comunicação entre todos os segmentos da conhecimento continua a ser a Filosofia. Continuamos gerando novos segmentos de investigação através da Filosofia, ao mesmo tempo que a tendência a Interdisciplinariedade exige uma visão cada vez mais holística para abordar os desafio no Terceiro Milênio.
Da mesma forma que a Arte, a Mística ou a Ciência, a Filosofia nunca deixará de existir enquanto houver pessoas buscando respostas.

O FILÓSOFO

Há uma grande diferença entre ser um Filósofo e estudar Filosofia. Qualquer pessoa que tente pela sua própria maneira de ver a realidade, entender racionalmente a vida , o sentido da existência, a sociedade, as relações humanas, o Universo, enfim, todos os eventos que o cercam, é um Filósofo em potencial, ainda que não possua qualquer instrução significativa.
Por outro lado é possível estudar a História da Filosofia, o pensamento dos filósofos, os eventos que marcaram a produção do pensamento humano e etc, sem nunca desenvolver uma postura de questionamento próprio sobre a realidade.
Via de regra porém, uma atitude leva a outra.
O verdadeiro Filósofo é antes de tudo um observador atento da realidade, um pensador dedicado, e que tente pelo seu próprio esforço desvendar o Universo que o cerca.
FILOSOFIA PRÁTICA

Embora a Filosofia em geral não seja produzida para resultados concretos e imediatos, crer que ela não tenha aplicação prática é apenas uma ilusão. A forma de compreender o mundo é que determina o modo como se produz as coisas, se investiga a natureza, se propõe as leis.
Ética, Política, Moral, Esporte, Arte, Ciência, Religião, tudo tem a ver com Filosofia.
O pensamento humano não apenas influenciou e influencia o mundo, na verdade é ele que o determina. Todos os movimentos sociais, econômicos, políticos, religiosos da história tem origem no pensamento humano, o domínio da Filosofia.
Se dedicar a Filosofia não é se abster da realidade, nada tem a ver com a alienação, antes o completo contrário. É procurar compreender a realidade, o primeiro passo para interagir com ela, ou mesmo alterá-la, da melhor forma possível.
Filosofar é examinar a realidade, e isso, de um modo ou de outro, todos fazemos constantemente. Ao se tentar resolver os problemas globais, sociais ou pessoais, é impossível se abster da Racionalidade. Entretanto há uma gama de situações onde a Razão não pode avançar por falta, ou excesso de dados, o que impossibilita decisões objetivas.
Entre em cena então a parte subjetiva humana, mais especificamente a Intuição, como meio de direcionar nosso foco de entendimento e apontar caminhos a serem trilhados pela racionalidade.
Isso é Filosofia em si.
...
De certo modo, a Humanidade sempre será Amante de Sophia.
Marcus Valerio XR

sexta-feira, 7 de março de 2008

Gerânio

Autora: Marisa Monte e outros
Dia Internacional da Mulher - 08 de Março

Ela que descobriu o mundo
E sabe vê-lo do ângulo mais bonito
Canta e melhora a vida, descobre sensações diferentes
Sente e vive intensamente
Aprende e continua aprendiz
Ensina muito e reboca os maiores amigos
Faz dança, cozinha, se balança na rede
E adormece em frente à bela vista
Despreocupa-se e pensa no essencial
Dorme e acorda
Conhece a Índia e o Japão e a dança haitiana
Fala inglês e canta em inglês
Escreve diários, pinta lâmpadas, troca pneus
E lava os cabelos com shampoos diferentes
Faz amor e anda de bicicleta dentro de casa
E corre quando quer
Cozinha tudo, costura, já fez boneco de pano
E brinco para a orelha, bolsa de couro, namora e é amiga
Tem computador e rede, rede para dois
Gosta de eletrodomésticos, toca piano e violão
Procura o amor e quer ser mãe, tem lençóis e tem irmãs
Vai ao teatro, mas prefere cinema
Sabe espantar o tédio
Cortar cabelo e nadar no mar
Tédio não passa nem por perto, é infinita, sensível, linda
Estou com saudades e penso tanto em você
Despreocupa-se e pensa no essencial
Dorme e acorda...

As mulheres tentam a todo custo encontrar seu lugar ao sol. Embora o que tenhamos conquistado sejam jornadas duplas ou mais de trabalho, estamos aí. Com esperança, com alegria, com emoção. Fazendo desse mundo, um mundo melhor, com certeza!
Mesmo influenciando o homem a comer o fruto proibido, lá no Éden, anos e anos atrás, acredito que nossa influencia tem sido mais positiva do que negativa. Por isso mulheres: Feliz dia internacional da mulher. O Senhor nos abençoe.

quarta-feira, 5 de março de 2008

Mito e Filosofia

Um mito é uma narrativa sobre a origem de alguma coisa (origem dos astros, da Terra, dos homens, das plantas, dos animais, do fogo, da água, dos ventos, do bem e do mal, da saúde e da doença, da morte, dos instrumentos de trabalho, das raças, das guerras, do poder, etc.).
A palavra mito vem do grego, mythos, e deriva de dois verbos: do verbo mytheyo (contar, narrar, falar alguma coisa para outros) e do verbo mytheo (conversar, contar, anunciar, nomear, designar). Para os gregos, mito é um discurso pronunciado ou proferido para ouvintes que recebem como verdadeira a narrativa, por que confiam naquele que narra: é uma narrativa feita em publico, na autoridade e confiabilidade da pessoa do narrador.

Quem narra o mito?
O poeta-rapsodo(é o nome dado a um artista popular ou cantor que, na antiga Grécia, ia de cidade em cidade recitando poemas). Quem é ele? Por que tem autoridade? Acredita-se que o poeta é um escolhido dos deuses, que lhe mostram os acontecimentos passados e permitem que ele veja a origem de todos os seres e de todas as coisas para que possa transmiti-la aos ouvintes. Sua palavra – o mito – é sagrada porque vem de uma revelação divina. O mito é, pois, incontestável e inquestionável.

Como o mito narra a origem do mundo e de tudo o que nele existe? De três principais maneiras:
1. Encontrando o pai e a mãe das coisas e dos seres, isto é, tudo o que existe decorre de relações sexuais entre forças divinas pessoais. Essas relações geram os demais deuses: os titãs (seres semi-humanos e semi-divinos), os heróis (filhos de um deus com uma humana ou de uma deusa com um humano), os humanos, os metais, as plantas, os animais, as qualidades, como quente-frio, seco-úmido, claro-escuro, bom-mau, justo-injusto, belo-feio, certo-errado, etc.
A narração da origem é, assim, uma genealogia, isto é, narrativa da geração dos seres, das coisas, das qualidades, por outros seres, que são seus pais ou antepassados. (Exemplo: Nascimento de Eros)
2. Encontrando uma rivalidade ou uma aliança entre os deuses que faz surgir alguma coisa no mundo. Nesse caso, o mito narra ou uma guerra entre forças divinas ou uma aliança entre elas para provocar alguma coisa no mundo dos homens.
O poeta Homero, na Ilíada, epopéia que narra a guerra de Tróia, explica por que, em certas batalhas, os troianos eram vitoriosos e, em outras, a vitória cabia aos gregos. Os deuses estavam divididos, alguns a favor de um lado e outros a favor do outro. A cada vez, o rei dos deuses, Zeus, ficava com um dos partidos, aliava-se com um grupo e fazia um dos lados - ou os troianos ou os gregos - vencer a batalha.
A causa da guerra, aliás, foi uma rivalidade entre as deusas. Elas apareceram em sonho para o príncipe troiano Páris, oferecendo a ele seus dons e ele escolheu a deusa do amor, Afrodite. As outras deusas, enciumadas, o fizeram raptar a grega Helena, mulher do general grego Menelau, e isso deu início à guerra entre os humanos.
O mito, narra a origem do mundo e de tudo que existe nele, e a terceira principal maneira de narração mítica é:
3. Encontrando as recompensas ou os castigos que os deuses dão a quem lhes obedece ou a quem lhes desobedece, respectivamente.
Como o mito narra, por exemplo, o uso do fogo pelos homens? Para os homens, o fogo é essencial, pois com ele se diferenciam dos animais, porque tanto passam a cozinhar os alimentos, a iluminar caminhos na noite, a se aquecer no inverno quanto podem fabricar instrumentos de metal para o trabalho e para a guerra.
Um titã, Prometeu, mais amigo dos homens do que dos deuses, roubou uma centelha de fogo e a trouxe de presente para os homens. Prometeu foi castigado (amarrado num rochedo para que as aves de rapina, eternamente, devorassem seu fígado) e os homens também. Qual foi o castigo dos homens?
Os deuses fizeram uma mulher encantadora, Pandora, a quem foi entregue uma caixa que conteria coisas maravilhosas, mas que nunca deveria ser aberta. Pandora foi enviada aos humanos e, cheia de curiosidade e querendo dar a eles as maravilhas, abriu a caixa. Dela saíram todas as desgraças, doenças, pestes, guerras e, sobretudo, a morte. Explica-se, assim, a origem dos males do mundo. Vemos, portanto, que o mito narra a origem das coisas por meio de lutas, alianças e relações sexuais entre forças sobrenaturais que governam o mundo e o destino dos homens. Como os mitos sobre a origem do mundo são genealogias, diz-se que são cosmogonias e theogonias.

Nascimento da filosofia
Podemos apontar como principais condições históricas do surgimento da filosofia na Grécia:
• As viagens marítimas – que permitiram aos gregos descobrir que os locais que os mitos diziam habitados por deuses, titãs e heróis eram, na verdade, habitados por outros seres humanos; e que as regiões dos mares que os mitos diziam habitadas por monstros e seres fabulosos não possuíam nem monstros nem seres fabulosos. As viagens produziram o desencantamento ou a desmistificação do mundo, que passou, assim, a exigir uma explicação sobre sua origem, explicação que o mito já não podia oferecer;
• A invenção do calendário – que é uma forma de calcular o tempo segundo as estações do ano, as horas do dia, os fatos importantes que se repetem, revelando, com isso, uma capacidade de abstração nova, ou uma percepção do tempo como algo natural e não como um poder divino incompreensível;
• A invenção da moeda – que permitiu uma forma de troca que não se realiza através das coisas concretas ou dos objetos concretos trocados por semelhança, mas uma troca abstrata, uma troca feita pelo calculo do valor semelhante das coisas diferentes, revelando, portanto, uma nova capacidade de abstração e de generalização;
• O surgimento da vida urbana – com predomínio do comercio e do artesanato, dando desenvolvimento a técnicas de fabricação e de troca, e diminuindo o prestigio das famílias da aristocracia proprietária de terras, por quem e para quem os mitos foram criados;
• A invenção da escrita alfabética – que, como a do calendário e a da moeda, revela o crescimento da capacidade de abstração e de generalização, uma vez que a escrita alfabética ou fonética, diferentemente de outras escritas – como, por exemplo, os hieróglifos dos egípcios ou os ideogramas dos chineses –, supõe que não se represente uma imagem da coisa que está sendo dita, mas a idéia dela, o que dela se pensa e se transcreve;
• A invenção da política – que introduz três aspectos novos e decisivos para o nascimento da filosofia:
1. A idéia da lei como expressão da vontade de uma coletividade humana que decide por si mesma o que é melhor para si e como ela definirá suas relações internas.
2. O surgimento de um espaço publico que faz aparecer um novo tipo de palavra ou de discurso, diferente daquele que era proferido pelo mito.
3. A política estimula um pensamento e um discurso que não procuram ser formulados por seitas secretas dos iniciados em mistérios sagrados, mas que procuram, ao contrario, ser públicos, ensinados, transmitidos, comunicados e discutidos.

A filosofia, ao nascer, é uma cosmologia, uma explicação racional sobre a origem do mundo e sobre as causas das transformações e repetições das coisas; para isso, ela nasce de uma transformação gradual dos mitos ou de uma ruptura radical com os mitos? Continua ou rompe com a cosmogonia e a theogonia? Duas foram as respostas dadas pelos estudiosos.
A primeira delas foi dada nos fins do século XIX e começo do XX, quando reinava um grande otimismo sobre os poderes científicos e capacidades técnicas do homem. Dizia-se, então, que a filosofia nasceu por uma ruptura radical com os mitos, sendo a primeira explicação científica da realidade produzida pelo Ocidente.
A segunda resposta foi dada a partir de meados do século XX, quando os estudos dos antropólogos e dos historiadores mostraram a importância dos mitos na organização social e cultural das sociedades e como os mitos estão profundamente entranhados nos modos de pensar e de sentir de uma sociedade. Por isso, dizia-se que os gregos, como qualquer outro povo, acreditavam em seus mitos e que a filosofia nasceu, vagarosa e gradualmente, do interior dos próprios mitos, como uma racionalização deles.
Atualmente, consideram-se as duas respostas exageradas e afirma-se que a filosofia, percebendo as contradições e limitações dos mitos, foi reformulando e racionalizando as narrativas míticas, transformando-as numa outra coisa, numa explicação inteiramente nova e diferente.
(adaptação livre com consulta às paginas brasilescola.com e algosobre.com.br)

Atividades

1. Como o mito narra a origem do mundo e de tudo o que nele existe?
2. Quais são as diferenças entre filosofia e mito?
3. Como o mito narra, por exemplo, o uso do fogo pelos homens?
4. Quem narra o mito?
5. Quem é ele?
6. Por que tem autoridade?


Jesus, ,vive, reina e voltará.

sábado, 1 de março de 2008

O pré-socráticos e seus elementos favoritos

Heráclito usou o "fogo" para representar a inquietação em que a vida se equilibra.

Antonio Luiz Monteiro Coelho da Costa
O primeiro filósofo, Tales de Mileto, procurou na água a origem de tudo o que existe. Outros filósofos jônicos deram respostas semelhantes, mas privilegiando outros elementos: Anaximandro de Mileto, discípulo de Tales, substituiu a água pelo ápeiron (que pode ser traduzido como ilimitado, indefinido). Anaxímenes de Mileto, discípulo de Anaximandro, optou pelo ar. Heráclito de Éfeso, que viveu depois destes (cerca de 500 a.C.), preferiu o fogo.
Hoje, essas escolhas podem parecer arbitrárias e mesmo ridículas, à primeira vista. Por que a água em vez do fogo, ou vice-versa? Trata-se, na verdade, de uma discussão sobre as propriedades e natureza do universo. Todos concordavam que todas as transformações e movimentos que constituem a natureza (physis) e a própria existência poderiam ser deduzidas das propriedades de uma substância única que forma todo o cosmos. Porém, não havia uma palavra para tal substância tão "neutra" quanto a atual matéria.
Numa forma não tão diferente, essa discussão ainda continua entre os filósofos que dizem que o principal fundamento do universo é a matéria (materialistas) e os que dizem que é a idéia (idealistas), Deus (panteístas), o Eu (empiristas), que há um único fundamento (monistas), dois (dualistas), muitos ou infinitos (pluralistas).
Para Tales (nascido na árida Fenícia), a propriedade fundamental do cosmos devia ser a vida, e o fundamento desta é a água: o sêmen é líqüido e todo alimento é suculento, ao passo que as coisas mortas secam. A água pode mudar de forma, dando origens ao sólido (gelo), ao gasoso (vapor) e ao próprio fogo na forma de calor biológico - assim, suas propriedades poderiam explicar toda a natureza. O primeiro filósofo era, portanto, radicalmente materialista.
Já Anaximandro tinha um conceito mais intelectual e abstrato da substância primordial: ela não poderia ter as propriedades determinadas desta ou daquela matéria particular, mas deveria conter todas as possibilidades em estado de indeterminação, dos quais todos os seres surgiriam pela separação dos contrários. Era algo próximo ao que hoje chamaríamos simplesmente de "matéria", porém dinâmica e potencialmente viva, mais como a matéria dos físicos modernos do que como a matéria inerte e passiva da física idealista clássica.
Anaxímenes voltou à idéia da vida como princípio do cosmos, mas teve dela uma imagem mais "espiritual": não a água, que lembra as funções biológicas "inferiores", mas o ar, identificado com a alma, "que nos mantêm unidos". Espírito, alma, alento, ânimo, psique, são todas palavras que derivam, em última instância, de termos que significaram originalmente respiração, vento, sopro. Quando alguém morre, dizemos que "expirou", deu o "último suspiro" e quando alguém se sente particularmente vivo, teve uma "inspiração", está "animado". Assim, o fundamento da natureza não seria algo tão grosseiro quanto os líquidos e mucos do corpo. Embora ainda fosse material e corporal, era também alma e pensamento: estava dado o primeiro passo no caminho do idealismo.
Heráclito, o Obscuro, geralmente considerado o maior dos pré-socráticos, teve uma imagem da natureza que poderíamos chamar mais "pessimista", ou, talvez, mais realista. Para ele, o fundamento de tudo não era a vida como ser vivo, o viver relativamente tranqüilo e estável sugerido pela água ou pelo ar, mas o processo de nascer, lutar, amar e morrer. Tranqüilidade e estabilidade são próprios dos mortos. Tudo flui, ninguém se banha duas vezes no mesmo rio, tudo é gerado por uma luta de contrários. O fogo (hoje diríamos melhor "energia"), permanentemente em movimento, foi a melhor imagem dessa inquietação e luta cósmicas que Heráclito pôde encontrar na natureza. Não tanto pela escolha do elemento, mas sim pela substituição do ser pelo processo (dialético, quer dizer, de luta-antítese e amor-síntese de contrários) que esse elemento simboliza, seu pensamento foi o mais inovador desde Tales.
O nascimento do idealismo
Porém, no mesmo ano em que Heráclito nascia, Pitágoras estava abandonando a cidade de Samos na Jônia (onde fracassou em impor suas idéias) e fundando em Crótona, na Magna Grécia (ocidente do mundo grego, no atual Sul da Itália ) uma escola de pensamento muito diferente: não materialista e monista, como as jônicas, mas idealista e dualista: o fundamento da natureza era, para ele, não uma substância física, mas o número, as relações matemáticas (diríamos, hoje, as "leis" da natureza), que existiriam independentemente da natureza propriamente dita, num mundo das idéias.
A matéria existiria, mas como algo inerte e sem propriedades, só adquirindo qualidades através daimposição de relações numéricas pelo espírito. A imagem paradigmática do cosmos de Pitágoras não era o ser vivo ou o processo biológico, mas a música, onde a matéria inerte (o ar), qualidades oriundas de uma idéia abstrata (a partitura) e expressas em relações numéricas (as notas musicais, definidas por uma certa freqüência de vibração). É de Pitágoras a expressão "música das esferas", referida à ordem do cosmos.
Também se deve a Pitágoras e seus seguidores a invenção da matemática como uma ciência dedutiva rigorosa (até então ela era basicamente uma coleção de receitas práticas para cálculos), importantíssimos teoremas da geometria, e a aplicação da matemática à musica e à astronomia (explicando os movimentos dos planetas, eclipses etc.).
Também se devem a ele idéias bem mais discutíveis, como a numerologia, a tese da reencarnação (como vertente filosófica, pelo menos), e a primeira legitimação filosófica das oposições mente/corpo, espírito/matéria, razão/instinto e, por extensão, também homem/mulher (esta sempre mais identificada à natureza, logo à matéria), senhor/escravo, sagrado/profano, esoterismo/exoterismo, governante/súdito, depois desenvolvidas por Platão.
Não por acaso, Pitágoras foi o primeiro déspota esclarecido a tentar criar uma sociedade utópica a partir de idéias abstratas: criou uma comunidade filosófico-religiosa com seus discípulos, os quais procuravam viver de forma ideal (em todos os sentidos da palavra) e guardavam seus ensinamentos em rigoroso segredo. Tudo correu bem até que os pitagóricos tentaram tomar o poder em Crótona e impor suas idéias: os crotonenses não quiseram dançar sua música e Pitágoras acabou morrendo no exílio.
Pitágoras não deixou escritos (pelo próprio caráter esotérico de seus ensinamentos), mas pelo que restou dos textos de seu seguidor Filolau (que vendeu na forma de livro os ensinamentos secretos em cerca de 400 a.C., pois estava na pobreza) podemos supor que ele formulou, pela primeira vez, a hipótese da pluralidade dos elementos materiais, que seriam cinco: os quatro elementos da "esfera": fogo, água, terra, ar e o holkas da esfera. O homem se dividia em quatro princípios: cérebro (inteligência), coração (alma e sensação), umbigo (gestação) e órgãos genitais (emissão do sêmen e criação), possivelmente associados aos quatro elementos. O cérebro indica o homem; o coração, o animal; o umbigo, a planta e os órgãos genitais, todos eles, pois "tudo floresce e cresce de um sêmen".
Representantes ainda mais radicais (e monistas) do idealismo da filosofia grega na Itália foram Parmênides e Zenão, da cidade de Eléia (por isso, sua escola foi chamada eleata). Eles negaram a realidade do tempo e do movimento, reduziram a natureza, a matéria e as oposições a meras ilusões. Tudo que realmente existia era o Um, ser ideal, eterno, perfeito e imutável (idéia que, curiosamente, lembra um pouco as do físico Stephen Hawking). Zenão, como Pitágoras, foi um revolucionário fracassado, e acabou torturado e executado pelo tirano de Eléia.
E a síntese na teoria original dos quatro elementos
Mais interessante para a história dos elementos, entretanto, foi Empédocles de Agrigento (cidade grega da Sicília - 490 a 435 a.C.). Apesar de ser originalmente um pitagórico (foi acusado por estes de trair os segredos da escola), criou e divulgou uma filosofia que pode ser considerada mais uma síntese do pensamento jônico com o sul-italiano e a primeira forma de pluralismo (e, apesar disso, uma forma de holismo) do que uma mera vulgarização do pitagorismo.
Para ele a natureza era a síntese de quatro elementos ou deuses: água (Néstis), ar (Hera), fogo (Zeus) e terra (Hades). Sua imagem da natureza não estava numa unidade de essência, biológica ou espiritual: era a própria pluralidade dos elementos que constituíam a natureza - o todo - relacionando-se por duas forças que também eram deusas: amizade (philia - igual a Afrodite, deusa do amor) e o ódio (neikos - Éris, a deusa da discórdia). A amizade exogâmica e mestiça, tende a unir os contrários, enquanto o ódio, endogâmico e racista (no limite, incestuoso), tende a separá-los e unir os semelhantes. Apesar da unidade da natureza ser, por assim dizer, fortuita, é bastante real: Empédocles era vegetariano por considerar que comer carne era comer a si mesmo, pois o ser é um.
Essa filosofia tem em si um pouco de cada uma das precedentes (especialmente a Heráclito, pela luta/amor entre os elementos), como é fácil perceber, mas além disso deve também à mitologia. Ele expressava sua filosofia em versos, como os antigos poetas da mitologia (e também como Parmênides) e ao contrário dos filósofos jônicos materialistas. Igualava os elementos a deuses e incluía entre eles a terra, reparando a injustiça cometida pelos jônicos. Desprezada pelos filósofos jônicos como demasiado grosseira, era, na mitologia grega de Hesíodo, a origem de toda a natureza, na forma da deusa Gaia.
Se o amor prevalecesse totalmente, o universo se tornaria um Todo indiferenciado como o Um dos eleatas; se o ódio fosse vitorioso, ele se decomporia em partes inconciliáveis em luta eterna, como o Fogo de Heráclito. O equilíbrio entre as duas grandes forças é que mantém o mundo como ele é. Esta concepção tem analogias na moderna teoria do caos: segundo esta, a vida precisa se manter no ponto de equilíbrio entre a ordem e o caos. A ordem total levaria à rigidez total e cristalina da máquina - o resultado final do amor de Empédocles; o caos total resultaria na massa informe de um gás, onde as moléculas se chocam desordenadamente - o ódio de Empédocles. Poderíamos também comparar estas forças com os conceitos freudianos de eros e thanatos.
A concepção de quatro elementos seria reapropriada pelo idealismo no Timeu de Platão, segundo o qual a matéria só ganha algum grau de ser ao lhe ser imposta uma forma (idéia). E como há apenas cinco sólidos perfeitos (isto é, figuras geométricas tridimensionais com todas as faces iguais), poderia haver, no máximo, cinco elementos: ao tetraedro (4 faces), forma mais simples e "pura", corresponde o fogo; ao octaedro (8 faces), o ar; ao icosaedro (20 faces), a água; ao cubo (6 faces), o mais difícil de mover, a terra. Sobrou o dodecaedro (12 faces), associado ao "Todo".
Segundo Platão, como o tetraedro, o octaedro e o icosaedro têm todos faces triangulares, as partículas de fogo podem transformar-se em água e ar e vice-versa por recombinação de faces (mas a terra, de faces quadradas, e o quinto elemento, de faces pentagonais, teriam que ser imunes a transformações em outros elementos). Os números dos elementos são 1 (fogo), 2 (ar), 3 (água) e 4 (terra).
Se, para Empédocles eles pareciam iguais em valor, para Platão e sucessores pareceram formar uma escada que vai do instinto grosseiro ao espírito puro. Aristóteles voltou a uma concepção mais "horizontal" dos primeiros quatro elementos, mas acrescentou a eles um quinto mais elevado: o éter, constituinte dos corpos celestes, substituiu o "Todo" do Timeu - mas geralmente ignorado por ser irrelevante para médicos e alquimistas, a não ser como símbolo do espírito. Foi essa a concepção que predominou no Ocidente até Paracelso.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Em busca de uma definição da Filosofia

(Extraído do livro Convite a Filosofia de Marilena Chauí)

Quando começamos a estudar Filosofia, somos logo levados a buscar o que ela é. Nossa primeira surpresa surge ao descobrirmos que não há apenas uma definição da Filosofia, mas várias. A segunda surpresa vem ao percebermos que, além de várias, as definições parecem contradizer-se. Eis porque muitos, cheios de perplexidade, indagam: afinal, o que é a Filosofia que sequer consegue dizer o que ela é? Uma primeira aproximação nos mostra pelo menos quatro definições gerais do que seria a Filosofia:

1. Visão de mundo de um povo, de uma civilização ou de uma cultura. Filosofia corresponde, de modo vago e geral, ao conjunto de idéias, valores e práticas pelos quais uma sociedade apreende e ompreende o mundo e a si mesma, definindo para si o tempo e o espaço, o sagrado e o profano, o bom e o mau, ojusto e o injusto, o belo e o feio, o verdadeiro e o falso, o possível e o impossível, o contingente e o necessário. Qual o problema dessa definição? Ela é tão genérica e tão ampla que não permite, por exemplo, distinguir a Filosofia e religião, Filosofia e arte, Filosofia e ciência. Na verdade, essa definição identifica Filosofia e Cultura, pois esta é uma visão de mundo coletiva que se exprime em idéias, valores e práticas de uma sociedade. A definição, portanto, não consegue acercar-se da especificidade do trabalho filosófico e por isso não podemos aceitá-la.

2. Sabedoria de vida. Aqui, a Filosofia é identificada com a definição e a ação de algumas pessoas que pensam sobre a vida moral, dedicando-se à contemplação do mundo para aprender com ele a controlar e dirigir suas vidas de modo ético e sábio. A Filosofia seria uma contemplação do mundo e dos homens para nos conduzir a uma vida justa, sábia e feliz, ensinando-nos o domínio sobre nós mesmos, sobre nossos impulsos, desejos e paixões. É nesse sentido que se fala, por exemplo, numa filosofia do budismo. Esta definição, porém, nos diz, de modo vago, o que se espera da Filosofia (a sabedoria interior), mas não o que é e o que faz a Filosofia e, por isso, também não podemos aceitá-la.

3. Esforço racional para conceber o Universo como uma totalidade ordenadae dotada de sentido.Nesse caso, começa-se distinguindo entre Filosofia e religião e até mesmo opondo uma à outra, pois ambas possuem o mesmo objeto (compreender o Universo), mas a primeira o faz através do esforço racional, enquanto a segunda, por confiança (fé) numa revelação divina. Ou seja, a Filosofia procura discutir até o fim o sentido e o fundamento da realidade, enquanto a consciência religiosa se baseia num dado primeiro e inquestionável, que é a revelação divina indemonstrável. Pela fé, a religião aceita princípios indemonstráveis e até mesmo aqueles que podem ser considerados irracionais pelo pensamento, enquanto a Filosofia não admite indemonstrabilidade e irracionalidade. Pelo contrário, a consciência filosófica procura explicar e compreender o que parece ser irracional e inquestionável.No entanto, esta definição também é problemática, porque dá à Filosofia a tarefa de oferecer uma explicação e uma compreensão totais sobre o Universo, elaborando um sistema universal ou um sistema do mundo, mas sabemos, hoje, que essa tarefa é impossível. Há pelo menos duas limitações principais a esta pretensão totalizadora: em primeiro lugar, porque a explicação sobre a realidade também é oferecida pelas ciências e pelas artes, cada uma das quais definindo um aspecto e um campo da realidade para estudo (no caso das ciências) e para a expressão (no caso das artes), já não sendo pensável uma única disciplina que pudesse abranger sozinha a totalidade dos conhecimentos; em segundo lugar, porque a própria Filosofia já não admite que seja possível um sistema de pensamento único que ofereça uma única explicação para o todo da realidade. Por isso, esta definição também nãopode ser aceita.

4. Fundamentação teórica e crítica dos conhecimentos e das práticas.A Filosofia, cada vez mais, ocupa-se com as condições e os princípios do conhecimento que pretenda ser racional e verdadeiro; com a origem, a forma e o conteúdo dos valores éticos, políticos, artísticos e culturais; com a compreensão das causas e das formas da ilusão e do preconceito no plano individual e coletivo; com as transformações históricas dos conceitos, das idéias e dos valores. A Filosofia volta-se, também, para o estudo da consciência em suas várias modalidades: percepção, imaginação, memória, linguagem, inteligência, experiência, reflexão, comportamento, vontade, desejo e paixões, procurando descrever as formas e os conteúdos dessas modalidades de relação entre o ser humano e o mundo, do ser humano consigo mesmo e com os outros. Finalmente, a Filosofia visa ao estudo e à interpretação de idéias ou significações gerais como: realidade, mundo, natureza, cultura, história, subjetividade, objetividade, diferença, repetição, semelhança, conflito, contradição, mudança, etc. Sem abandonar as questões sobre a essência da realidade, a Filosofia procura diferenciar-se das ciências e das artes, dirigindo a investigação sobre o mundo natural e o mundo histórico (ou humano) num momento muito preciso: quando perdemos nossas certezas cotidianas e quando as ciências e as artes ainda não ofereceram outras certezas para substituir as que perdemos. Em outras palavras, a Filosofia se interessa por aquele instante em que a realidade natural (o mundo das coisas) e a histórica (o mundo dos omens) tornam-se estranhas, espantosas, incompreensíveis e enigmáticas, quando o senso comum já não sabe o que pensar e dizer e as ciências e as artes ainda não sabem o que pensar e dizer. Esta última descrição da atividade filosófica capta a Filosofia como análise (das condições da ciência, da religião, da arte, da moral), como reflexão (isto é, volta da consciência para si mesma para conhecer-se enquanto capacidade para o conhecimento, o sentimento e a ação) e como crítica (das ilusões e dos preconceitos individuais e coletivos, das teorias e práticas científicas, políticas e artísticas), essas três atividades (análise, reflexão e crítica) estando orientadas pela elaboração filosófica de significações gerais sobre a realidade e os seres humanos. Além de análise, reflexão e crítica, a Filosofia é a busca do fundamento e do sentido da realidade em suas múltiplas formas indagando o que são, qual sua permanência e qual a necessidade interna que as transforma em outras. O que é o ser e o aparecer-desaparecer dos seres? A Filosofia não é ciência: é uma reflexão crítica sobre os procedimentos e conceitos científicos. Não é religião: é uma reflexão crítica sobre as origens e formas das crenças religiosas. Não é arte: é uma interpretação crítica dos conteúdos, das formas, das significações das obras de arte e do trabalho artístico.Não é sociologia nem psicologia, mas a interpretação e avaliação crítica dos conceitos e métodos da sociologia e da psicologia. Não é política, mas interpretação, compreensão e reflexão sobre a origem, a natureza e as formas do poder. Não é história, mas interpretação do sentido dos acontecimentos enquanto inseridos no tempo e compreensão do que seja o próprio tempo. Conhecimento do conhecimento e da ação humanos, conhecimento da transformação temporal dos princípios do saber e do agir, conhecimento da mudança das formas do real ou dos seres, a Filosofia sabe que está na História e que possui uma história.

A Condição Humana: Natureza x Cultura

por Marilena Chauí

O homem não nasce homem pois precisa da educação para se humanizar. Muitos são os exemplos dados por antropólogos e psicólogos a respeito de crianças que, ao crescerem longe do contato com seus semelhantes, permaneceram como se fossem animais.
Na Alemanha, no século passado, foi encontrado um rapaz que crescera absolutamente isolado de todos. Kaspar Hauser, como ficou conhecido, permaneceu escondido por razões não esclarecidas. Como ninguém o ensinara a falar, só se tornou propriamente humano quando sua educação teve início. Nessa ocasião ficou constatado que possuía inteligência excepcional, até então obscurecida pelo abandono a que fora relegado.
O caso da americana Helen Keller é similar, embora as circunstâncias sejam diferentes. Nascida cega, surda e muda, mesmo vivendo entre seus familiares, a menina permaneceu afastada do mundo humano até os sete anos de idade, quando a professora Anne Sullivan lhe tornou possível a compreensão dos símbolos, introduzindo-a no mundo propriamente humano.
Esses casos extremos servem para ilustrar o processo comum pelo qual cada criança recebe a tradição cultural, sempre mediada pelos outros homens, com os quais aprende os símbolos e torna-se capaz de agir e compreender a própria experiência.
A linguagem simbólica e o trabalho constituem, assim, os parâmetros mais importantes para distinguir o homem dos animais. O homem é transformador da natureza e o resultado dessa transformação se chama cultura. Mas para produzir cultura o homem precisa da linguagem simbólica. Os símbolos são invenções humanas por meio das quais o homem pode lidar abstratamente com o mundo que o cerca. Depois de criados, entretanto, eles devem ser aceitos por todo o grupo e se tornam a convenção que permite o diálogo e o entendimento do discurso do outro.
Os símbolos permitem o distanciamento do mundo concreto e a elaboração de idéias abstratas: com o signo “casa”, por exemplo, designamos não só determinada casa, como também qualquer casa. Além disso, com a linguagem simbólica o homem não está apenas presente no mundo, mas é capaz de representá-lo: isto é, o homem torna presente aquilo que está ausente. A linguagem introduz o homem no tempo, porque permite que ele relembre o passado e antecipe o futuro através do pensamento. Ao fazer uso da linguagem simbólica, o homem torna possível o desenvolvimento da técnica e do trabalho humano, enquanto forma sempre renovada de intervenção na natureza.
Recentemente, pesquisas realizadas no campo da etologia (estudo comparado do comportamento dos animais, buscando a regularidade desse comportamento) têm mostrado que alguns tipos de chimpanzés conseguem fazer utensílios, e criam complexas organizações sociais baseadas em formas elaboradas de comunicação. As conclusões dessas pesquisas tendem a atenuar a excessiva rigidez das antigas concepções sobre a distinção entre instinto e inteligência animal e humana.
É evidente que existem grandes diferenças entre os animais conforme seu lugar na escala zoológica: enquanto uma abelha constrói a colméia e prepara o mel segundo padrões rígidos típicos das ações instintivas, um mamífero, que é um animal superior, do ponto de vista da escala zoológica, é capaz de desenvolver outros comportamentos mais flexíveis, e portanto menos previsíveis. Diante de situações problemáticas, animais superiores podem encontrar soluções criativas porque fazem uso da inteligência. Um cachorro faz uso da inteligência quando aprende a obedecer ordens do seu dono ou quando, mobilizado pela fome, desenvolve a capacidade de se adaptar às novidades mediante recursos de improvisação.
O homem, por sua vez, tem instintos como o dos animais, mas possuindo consciência de si próprio, orienta, por exemplo, o controle da sexualidade e da agressividade, submetendo-se de início à normas e sanções da comunidade. O homem foi “expulso do paraíso” quando deixou de se instalar na natureza da mesma forma que os animais e as coisas.
Assim o comportamento humano passa a ser avaliado pela ética, pela estética, pela religião ou pelo mito. Isso significa que os atos referentes à vida humana são tidos como bons ou maus, belos ou não, e essa análise é válida para qualquer ação humana: andar, dormir, alimentar-se não são atividades puramente naturais, pois estão marcadas pelas soluções dadas pela cultura e, posteriormente, pela crítica que o homem faz à cultura.

A condição humana é de ambiguidade porque o homem é o que a tradição cultural quer que ele seja e também a constante tentativa de ruptura dessa tradição. Assim a sociedade humana surge porque o homem é capaz de criar interdições, isto é, proibições, normas que definem o que pode e o que não pode ser feito. No entanto, o homem é também um ser necessitado de transgressões, de desobediências que rejeitam fórmulas antigas e ultrapassadas para instalar novas normas, mais adequadas às necessidades humanas diante dos problemas colocados pela existência.

domingo, 13 de janeiro de 2008

Tema: Magia, Ciencia e Religião


A prática da magia em comunidades animistas

Por Ronaldo Lidório
09 de Abril de 2007

Neste artigo trato da magia do ponto de vista puramente antropológico. Desta forma não iremos abordar a prática mágica sob o crivo da teologia bíblica ou mesmo sob uma plataforma de julgamento moral. Meu desejo é tão somente observar o ato mágico em uma abordagem êmica, a partir da cosmovisão daquele que a pratica.
Magia e a negação de um estado evolutivo.
A magia, religião e ciência são assuntos tratados muitas vezes de forma conjunta na antropologia pela clara conexão entre seus conceitos e normalmente descritos de forma evolutiva. Ou seja, enquanto a religião seria um estágio evoluído da magia a ciência seria um estágio evoluído da religião. Para alguns a magia é uma solução embrionária para os conflitos da vida por se basear na manipulação de elementos conhecidos ou fabricados pelo homem a fim de gerar efeitos desejados. Malinovsky posiciona seu aparecimento em épocas recuadas da humanidade, propondo assim o conceito de seu desenvolvimento[1]. Desta forma a religião seria um desenvolvimento da magia, ou processo mágico, uma elaboração mais organizada e lógica da procura pelo divino ou do controle da vida. Eliade crê que a religiosidade humana está associada ao desejo de se controlar a vida, busca esta que passa pela magia, religiosidade e ciência. Para estes as respostas outrora buscadas na magia são tratadas na religiosidade e as respostas buscadas na religiosidade possuem propostas de solução científicas[2].
Penso ser pouco provável que magia, religião e ciência sejam frutos de um estado evolutivo social. Primeiramente pela constância de suas aparições e experimentações. Culturas mágicas não desenvolvem religiosidade não mágicas. Sociedades científicas não deixaram de forma geral a prática mágica e comumente vemos ciência e magia respondendo a diferentes perguntas em um mesmo agrupamento humano. O processo de desenvolvimento do pensamento, da sociedade moderna que passou da religiosidade para a veneração à ciência, não pode ser atribuído ao estado evolutivo social mas sim à influência filosófica e ambiental. Em segundo lugar pela clara ligação entre o valor utilitário da magia, religião e ciência de acordo com o padrão cultural existente. Todos os três sistemas apresentados são de fato utilitários e se propõe a solucionar os conflitos da vida, com diferentes abordagens. Percebo que em culturas existenciais, cerimoniais, centralizadas no homem e seus conflitos de hoje, há grave incidência de magia, que coloca de certa forma o homem no centro de seu universo. Em culturas espiritualistas e totêmicas em que os seres mítidos povoam e governam o universo a religião tende a ser a resposta proposta para a solução dos problemas. Em culturas humanistas e progressistas a ciência está em ascendência como cadeia de soluções para a vida humana. Parece-me que o padrão cultural, portanto, determina que tipo de resposta se procura ou se desenvolve fazendo com que magia, religião e ciência compartilhem o mesmo cenário de idéias mas não sejam em si, resultado de um estado evolutivo.
Conceito de magia
O estudo da magia passa pelo desenvolvimento do tema a partir de Tylor que a reportou, mesmo que de forma embrionária, em sua obra “Civilização Primitiva” propondo o conceito da magia simpática, sempre ligada a semelhança entre os objetos manipulados. Frazer e Lehmann desenvolveram o tema defendendo que todos os ritos mágicos são simpáticos, com base na ligação (semelhança) entre o todo e a parte, entre o objeto manipulado e o alvo da magia. Lehmann chama nossa atenção para o fato da magia ser uma atribuição utilitária, ou seja, que possui objetivo específico e técnica também específica. Mauss faz uma diferença entre magia e ato religioso sugerindo que o segundo possui uma estrutura invocatória não condizente com magia.
Como podemos, portanto, conceituar magia ? Creio que são práticas, coordenadas por um indivíduo ou a partir dele, com manipulação de elementos naturais, não centralizada em invocação espiritual personificada, com base na crença de que tal manipulação, segundo determinada técnica ou coberta por certo poder poderá produzir, assim, o resultado esperado. Apesar da natureza da magia ser simpática, baseada nas semelhanças, na imagem do efeito/objeto a ser produzido, nem todas podem ser rotuladas dentro desta classificação[3]. Para fins aplicáveis estudaremos algumas categorias de magia como branca e negra, imitativa, alegórica e simpática. Devemos, porém, compreender que toda prática mágica advém da crença da existência de uma força que governa a vida, mesmo que parcialmente, e que é manipulável. Assim não nos convém distinguir de forma tão grave a magia do ato de culto como faz Mauss pois pode haver clara correlação entre estas diferentes práticas. Encontraremos cultos com atos mágicos e magia onde há invocação espiritual personalizada, manipulável. Parece-me que magia e culto compartilham da idéia de relação com o sobrenatural, mesmo que por vias distintas.
O valor utilitário da magia
É preciso termos em mente o valor utilitário da magia pois esta insere o homem no contexto das escolhas universais, ou seja, o torna co-participante das soluções dos problemas da vida. Desta forma, os grupos onde a prática de magia é acentuada e universalizada tendem a serem mais antropocêntricos e desenvolverem toda uma organização social, religiosa e mitológica com base no valor utilitário da crença. Melatti relata este valor utilitário quando nos diz que entre os Craôs “a magia que faz o caçador para matar veado campeiro nos mostra a presença de outros modos de classificar. Aquele que quer matar veado campeiro, só deve comer carne de animais que andam de dia e evitar a daqueles que entram em atividade à noite, pois o campeiro anda durante o dia. Há, pois, uma classificação de animais segundo a etapa do dia em que estão em atividade. O caçador deve também evitar comer carne de animais espantadiços, pois senão o veado se torna igualmente espantadiço. Por conseguinte, percebe-se a existência de uma outra classificação de animais em calmos e espantadiços”[4]. Neste aspecto a magia é um ato organizado, intencional e utilitário.
Compreender os conceitos sobre magia torna-se importante para analisarmos os processos mágicos. O conceito de magia deve ser compreendido como uma instituição baseada na crença da força sobrenatural regulada pela tradição de práticas, ritos e cerimônias que se apela para as forças ocultas e se procura alcançar o domínio do homem sobre a natureza. Já o perfil da magia nos mostra que a mesma é em geral impessoal, repetitiva, manipulável e tem implicações sociais sendo também cerimonial. Ela pode ser produzida ou simplesmente possuída ou comprada como um amuleto ou talismã[5].
Em 1891 Codrington dissertou sobre o elemento invisível ‘Mana’ e o definiu como sendo “uma força impessoal que está sempre ligada a uma pessoa que dirige esta força”[6]. Mana, portanto, é provavelmente o melhor termo que temos antropologicamente para definir a enorme variedade de forças e poderes manipuláveis pelo homem e expressos através de distintos termos. Os iroqueses o designam de ‘wokonda’, os algonkis de ‘manitu’. Os pigmeus africanos de ‘megbe’ e os bantus de ‘ndoki’. Mana pode ser bom ou ruim, com graus distintos e variados de controle do homem sobre esta força. O ‘mana’ de uma lança, afirma Kaser, “é definido pelo fato de ela atingir o alvo com maior freqüência do que outras lanças, ou porque ela mata peixes maiores”[7]. Desta forma podemos concluir que o conceito de ‘mana’ está na raiz do processo antropológico designado como magia, a manipulação de elementos (que são cobertos por ‘força’) impessoais de forma a causarem um efeito extraordinário. Portanto de certa forma a magia centraliza-se no homem e seus desejos o servindo.
Os elementos da magia
Pensemos sobre os elementos da magia. Alguns elementos claros irão ajudar-nos a identificá-la e analisá-la em sua forma apresentável.
O primeiro elemento da magia é o pensamento, ou a crença. No caso a crença da existência e presença de uma força sobrenatural manipulável. Seja ela uma forma impessoal, mecânica, ou mesmo uma força pessoal espiritual que possa ser manipulada através de elementos mecânicos e visíveis. Em culturas animistas a clara percepção de que o mundo natural é animado pelo sobrenatural cria, em si, as condições ideais para a prática mágica. Não devemos, porém, reduzir a prática da magia apenas a ambientes onde haja uma crença organizada do sobrenatural. Muitas vezes a força manipulada é desconhecida, ou pouco explicada, sendo que a concentração do esforço da magia não se dá no sobrenatural mas sim na forma de manipula-lo através do mundo natural. Entendemos, assim, a natureza humana, manipulável e utilitária da magia.
O segundo elemento é o indivíduo. Pode ser nomeado de mágico, feiticeiro, xamã e assim por diante. É, porém, aquele que (com ou sem títulos de reconhecimento desta prática) coordena o ato mágico. Em culturas hierarquizadas facilmente encontraremos pessoas específicas com tal habilidade e responsabilidade. O chamaremos aqui de ‘mágico’. Em culturas, acéfalas, a magia é horizontalizada, praticada por quase todos. Mesmo aqueles que não a praticam, não detém o conhecimento ou habilidade, podem chegar a tal estágio sendo que ela é acessível e não uma especialidade. Eliade e Mauss defendem que a categoria de ‘feiticeiro’, personagem que controla ou propõe o ato mágico, é distinguível, ou seja, não é feiticeiro quem quer. Seriam pessoas com particularidades de parentesco ou definição clânica, ou com habilidades especiais, ou que foram treinadas, ou iniciadas, nesta arte por outros[8]. Em minha observação esta é uma avaliação aplicável apenas a certos padrões culturais, mais hierarquizados. De toda forma, independente da configuração restritiva do coordenador do ato mágico, a ele se confere certas características. Normalmente é uma pessoa reconhecida de possuir tal poder, habilidade ou conhecimento. Também se dedica, entre outras coisas, de forma especial à prática da magia, sendo procurado para tal pela comunidade. Pode ser identificado a partir da idade (o velho) ou de algum defeito físico permanente. Quanto maior o mistério a respeito do indivíduo que pratica a magia maior seu poder de encantamento perante a população. Por vezes pode estar associado a uma função na sociedade. Entre os Ashante[9] de Gana o guardião de cerimônias religiosas da família real é também o responsável pelo ato mágico. Entre os Konkombas os ‘mágicos’ são os que foram iniciados à esta arte, por escolha de outros que já a praticam.
O terceiro elemento é a preparação. A magia, e o indivíduo que a pratica, demanda certa preparação específica. A escolha dos objetos, sua separação e preparo, bem como o preparo do próprio indivíduo, normalmente revendo seu conhecimento ou buscando entrar em transe afim de potencializar sua habilidade, ou ainda através de invocações e jejum, são atos normalmente encontrados na prática da magia. Entre os Tariano do Alto Rio Negro a prática de magias de proteção tem início com a preparação dos elementos, de certas pedras e folhas que são separadas a fim de se gerar fumaça que possa purificar e proteger as pessoas que passem por esta cerimônia. Pensando no perfil simpático (com base na semelhança) da magia é normal que os elementos separadas, ou coletados, sejam próximos, semelhantes, parecidos, com aquele que é alvo da magia. O uso da fumaça está associada à purificação e proteção em atos mágicos, em diversas culturas, devido à sua forma fluida, disforme, semelhante ao espírito. Assim quando o Tariano a utiliza para benzer, proteger ou curar, uma certa criança que há muito está doente, a associação da fumaça com a vida, com seu espírito, é clara. Outros elementos também podem estar associados à força da vida e serem usados com este fim devido à sua semelhança. A água, terra, ar, fogo, fumaça, sopro, raiz e casca de árvores são os elementos mais comuns associados à força da vida. Estes são, portanto, elementos universais. Há também os elementos particulares. Neste caso a magia se dá através de representações que demandam algo que se pareça com o alvo mágico, de forma objetiva. Entre os Ewe de Gana uma mecha de cabelo é o elemento primordial para o preparo de magia, seja branca ou negra. Entre os Konkombas unhas e a água do rio onde alguém de banhou[10]. Entre os Aborígines, as marcas da mão na terra, que são coletadas (a terra) e separadas para o ato mágico. Tais elementos passam por um ‘preparo’ que os espiritualiza. Passam a representar seus alvos (pessoas, famílias, comunidades, iniciativas como uma caçada, projetos sociais e assim por diante) e o ‘trato’ que lhes for dado resultará (causando assim efeito) no alvo[11]. O preparo, porém, não se restringe aos elementos coletados ou ao indivíduo que os manipulará. Pode também abranger o local onde se desenvolverá o rito mágico, preparando-o de forma específica, e à própria pessoa que encomendou a magia ou comunidade que dela se beneficiará.
O quarto elemento é o rito mágico. Este rito possui, em geral, uma forma estática de desenvolvimento. Possui uma ordem, um ‘trato’ específico nos elementos manipulados que não mudam. Se há atos de invocação estes também são sempre os mesmos. Desta forma os elementos de invocação como a música, instrumentos musicais, cânticos, dança, roupa e ornamentos, os elementos de processo como pedras, raizes, folhas e os elementos simpáticos como mechas de cabelo, unhas, roupas, água do banho etc, seguem um padrão preconcebido de coleta, preparo e rito. O rito mágico possui normalmente uma forma elaborada de se processar. Quando os Konkombas manipulam a água do rio onde uma pessoa se banhou a fim de causar-lhe mal, isto se dá em um ambiente preparado para esta finalidade, debaixo de uma árvore de Itooh de folhas frondosas, durante noite clara com boa lua, em lugar distante da comunidade onde os atos invocatórios não são ouvidos e o nome da pessoa alvo da magia é repetido diversas vezes de forma genêrica (nome do seu clã), nunca da pessoa em particular. Portanto é claro apenas para poucas pessoas quem está sendo alvo daquela prática mágica. A água do rio, neste caso, é colocada dentro de uma cabaça e neste momento, após atos invocatórios e ‘arrumação’ dos elementos manipuláveis (água, cabaça, árvore frondosa, palavras, nomes etc) a mistura de terra com a água (que representa a força da vida) produziria obstáculo sobre sua vida, tornando aquela pessoa ‘pesada’, com movimentos curtos e mais lentos visto ser a terra mais pesada que a água. A mistura de sangue com a água produziria cortes, arranhões, infecções e até mesmo hemorragias. As vezes associado também a quedas e fraturas. A mistura de saliva com á água produziria relacionamentos partidos, enfermidades internas ou muito comumente incesto sendo que a saliva é a parte impura do corpo, que deve ser colocada para fora e não para dentro[12].
Estes elementos, e seus resultados, porém, podem conter ainda significados claros de associação (terra, sangue, saliva) ou simplesmente estarem cobertos pela tradição da prática mágica. Neste segundo caso são utilizados e cridos porém a associação original dada pelos pais já foi perdida. De toda forma é certo pensar que boa parte dos atos mágicos possuem, em sua origem, uma forma simpática (de associação e semelhança) com o alvo da magia. Em todo ato mágico, aberto ou fechado, seus participantes poderão apontar, portanto, os resultados esperados.
As categorias da magia
Podemos categorizar a magia como branca, negra, simpática, alegórica e imitativa.
Branca, que produz ou colabora com a cura, proteção e prosperidade. A magia branca é uma prática que visa o benefício, sobretudo, do manipulador dos elementos, ou alguém a quem serve momentaneamente, de forma objetiva. Está normalmente associada a uma magia voluntária, solicitada pelo que a necessita. Os processos de magia branca comunitários através de benzimento são sempre abertos e coletivos. Possui também uma característica abrangente não apenas atuando no problema em si mas em suas áreas de abrangência. Quando os Tariano, por exemplo, realizam o ato mágico de benzimento buscando proteção e cura para a comunidade, estes permitem que a fumaça também seja ventilada para o rio próximo, para purificação do ambiente, demonstrando a não percepção exata da causa dos males. Não raramente, após o benzimento que objetiva a cura ou proteção, comenta-se que o rio também lhes deu mais peixes mostrando um fator importante no processo da magia em grupos animistas: a conexão entre os elementos da vida. Ao passo que uma cultura ocidental urbanizada vê os atos da vida, seus conflitos e soluções com um arquivo, com pastas separadas e catalogadas, um grupo animista os vê como um cesto, um aturá, cujas fibras se entrelaçam sem que se saiba exatamente onde começam ou terminam.
Como magia branca simples e doméstica podemos exemplificar os Quéchuas que organizam ossos de lhama atrás das portas de suas casas, em ordem e tamanho específicos, a fim de proporcionar abundância naquele lar. Há necessidade de conhecimento específico dos elementos e sua manipulação; conhecimento este passado dos velhos para os novos. Neste caso é uma magia aberta, comunitária, visto que todos podem observá-la, aprendê-la e praticá-la.
Negra, temida por trazer destruição e morte. Pode ser praticada pelo homem mágico ou feiticeiro, ou pela categoria rara de bruxo. Normalmente a magia negra é mais especializada e restritiva, sendo que apenas alguns podem aprendê-la ou realizá-la. Em alguns casos pode ser herdada. É aprendida a partir de uma iniciativa pontual, iniciando-se o jovem à arte de tal magia pelo velho, que já a pratica. O bruxo, antropologicamente, usaremos aqui para designar a figura reclusa de um homem, ou mulher, que se aperfeiçoa na arte de dominar, matar ou destruir a partir de atos mágicos ou invocatórios, portanto não se resume apenas à prática mágica. É recorrente a crença de que há uma ligação entre a prática de magia negra e o desenvolvimento de problemas físicos naqueles que a praticam.
Entre os Konkombas de Gana a magia negra é praticada pelo feiticeiro que acumula a função de guardião dos fetiches. A proximidade com os fetiches homologa seu conhecimento, que é empírico e não herdado ou aprendido. A utilização do sangue derramado de forma específica dentro de uma cabaça, em proporcional mistura com água e terra (onde está a força da vida na fase infantil enquanto a água a concentra na fase adulta) é necessário para a prática desta magia que pode causar enfermidade, desolação, morte ou desencanto com a vida. O sangue, assim, seria um elemento isolado e específico para a magia negra, não sendo utilizado para finalidades de cura e proteção. O perfil simpático, semelhante, da magia também é encontrado na magia negra. Uma mecha de cabelo, portanto, que pode ser manipulada com a intenção de produzir prosperidade na pessoa alvo que encomenda a magia pode ser igualmente utilizada para a manipulação de elementos (com outras variações) a fim de causar enfermidade ou morte em seu dono. Por este motivo freqüentemente encontramos, em agrupamentos animistas, um cuidado zeloso na proteção de partes do corpo que podem ser mais facilmente coletadas como cabelo e unhas. São muitas vezes guardados cuidadosamente e depois descartados em lugares distantes.
Imitativa, referente a amor e ódio e um exemplo clássico é o wodu que imita o objeto alvo sendo porém bem mais extensa do que percebemos na forma como se tornou mais conhecida. No Haiti a magia imitativa é popularizada através de bonecos feitos e manipulados, com forma das pessoas que desejam atingir. No caso do vodu seria necessário que houvesse algum elemento pertencente a esta pessoa, em um ambiente propício para o ato mágico. E se crê que, havendo semelhança suficiente entre o boneco e a pessoa, dentro de uma manipulação preconcebida e aprendida, os atos realizados com o boneco (manipulação) se refletirão na pessoa que o boneco representa. Uma das suas variáveis seria a imitação de roças, casas, ambientes naturais etc. Como o roubo de um elemento representador (arroz, da roça que deseja atingir, por exemplo) levando-o para casa ou para um local específico e manipulando-o. Neste caso poderia ser queimado a fim de se obter a queima daquela roça e perda da produção.
Simpática que trata da fertilidade, proteção e paixão. De forma geral pressupõe-se que toda magia é simpática, porém utilizamos aqui o termo para designar as iniciativas mágicas usadas para procriação, proteçào e paixão, como a branca e imitativa mas com a característica de serem atos abertos e não velados, disponível para compra ou prática, de forma simples e comunitária. Está associada a tabus e talismãs e se propõe a controlar o acaso e não produzir um fim específico. No Brasil poderíamos classificar como magia simpática a utilização de branco como roupa de ano novo produzindo felicidade e fartura, o uso de fitas do senhor do Bonfim nos pulsos para proteção. São chamadas popularmente de simpatias.
Alegórica, produtoras de ganhos e perdas, com elementos específicos que em determinadas situações podem produzir ganhos e, em sua ausência, prejuízos, como a água benta vendida em algumas igrejas. Assemelha-se à imitativa e a mais forte diferença seria a crença. Enquanto a primeira está mais associada ao acaso, a forças indefinidas, a segunda está associada a forças pessoais definidas como invocações, profecias e visões. Entre os Aborígines da Austrália o sonho manifesta elementos que podem ser utilizados na magia. Neste caso a magia não é um ato produzido mas sim um acontecimento, resultado do poder e desejo do divino para um indivíduo que sonha o sagrado. Desta forma o sonho é em si um processo mágico, com efeito sobrenatural, com participação, mesmo que inconsciente, do praticante ou sonhador. O relato de que o sonho alegoriza a vida, e os acontecimentos do sonho se revelariam na vida cotidiana traz esta porção alegórica à magia encontrada também em diversas outras sociedades.
Conclusão
Por fim gostaria de mencionar a conexão entre os elementos e formas de prática mágica. Os problemas estão relacionados com as soluções. Os ambientes com os indivíduos que praticam a magia. Os objetos utilizados na magia se relacionam com os que a encomendam ou são alvos da mesma. A forma de praticá-la se relaciona com o resultado a ser produzido. A técnica com a pessoa que manipula os elementos e assim por diante.
Isto demonstra que, primeiramente, a magia é um ato social central nas culturas que a praticam de forma abrangente. Assim torna-se relevante, especialmente para o pesquisador, observar a prática mágica como sendo uma pista para o centro da religiosidade do povo. Em segundo lugar por sua abrangente prática em contexto animista. Isto se explica pelo fato do animismo já produzir, em si, a plataforma de idéia do sobrenatural sobre o natural, propício à magia. Magias também estão presentes em atos invocatórios coletivos e organizados, cúlticos, como pajelanças, e assim não devemos reduzi-la apenas a ambientes de forças puramente mecânicas, impessoais. Em terceiro lugar por sua característica utilitária. Como se propõe a organizar a vida, e solucionar possíveis problemas, a magia é um ato religioso e social regulador. Este talvez seja o principal motivo que a faça tão popularizada, temida e utilizada.
[1] Ver Malinovksy - Magia, Ciência e Religião. Lisboa: Edições 70.
[2] Eliade, M, 1958, Rites and Symbols of Initiation, New York: Harper and Row.
[3] Ver Radcliffe-Brown, A R, 1952, Structure and Function in Primitive Society, London: Cohen and West.
[4] Julio Melatti - Publicado em 1975 no Informativo FUNAI, ano IV, n° 14, pp. 13-20
[5] A diferença normalmente aceita entre amuleto e talismã é que o primeiro serve para afastar desgraças enquanto o segundo atrai a sorte.
[6] Codrington, R. H. – The Melanesians. Studies in their anthropology
[7] Kaser, Lothar – Diferentes Culturas: Uma introdução a etnologia – Editora Descoberta
[8] Eliade, Mircea - Imagens e Símbolos – Ensaio Sobre o Simbolismo Mágico - religioso. São Paulo: Martins Fontes, 2002
[9] Ver Evans-Pritchard, E. E, 1937, Witchcraft, Oracles and Magic among the Azande, London: OxfordUniversity Press
[10] Ver o artigo Religous Phenomenology among the Konkomba People of Ghana - Ronaldo Lidório
[11] Ver Esboço de uma teoria geral da magia, de Marcel Mauss, Ediçòes 70
[12] Cultural identity and religious phenomenology – The impact of the gospel in a Konkomba worldview. Dissertação em Etnologia – 2001. Ronaldo Lidório
Última Atualização ( 04 de Dezembro de 2007 )

sábado, 1 de dezembro de 2007

Métodos de Interpretação Bíblica
A Bíblia é a Palavra de Deus. Mas, algumas das interpretações derivadas dela não são. Existem muitas seitas, cultos e grupos cristãos que usam a Bíblia declarando que as suas interpretações são as corretas. Muito freqüentemente, no entanto, as interpretações não apenas diferem dramaticamente umas das outras, como são claramente contraditórias. Isto não significa que a Bíblia seja um documento contraditório. Antes, o problema está naqueles que a interpretam e/ou nos métodos que eles usam. Como nós somos pecadores, somo incapazes de interpretar perfeitamente a palavra de Deus todo o tempo. O corpo, a mente, a vontade e as emoções são afetadas pelo pecado e tornam a interpretação 100% exata uma impossibilidade. Isto não significa que entender corretamente a palavra de Deus seja impossível. Mas que devemos nos aproximar à Sua palavra com cuidado, humildade e razão. Adicionalmente, nós precisamos o que de melhor nós poderíamos necessitar: a direção do Espírito Santo na interpretação da Palavra de Deus. Além do mais, a Bíblia é inspirada por Deus e dirigida ao Seu povo. O Espírito Santo nos ajuda a compreender o que a Palavra de Deus significa e como aplicá-la em nossas vidas. No nível humano, para minimizar os erros que possam advir das nossas interpretações, nós precisamos conhecer métodos básicos de interpretação da Bíblia. Eu irei listar alguns destes princípios na forma de questões e então aplicá-los a uma passagem da Escritura. Eu sigo os seguintes princípios como linhas-mestras para examinar uma passagem. Elas não são exaustivas e nem absolutas.
Quem escreveu/falou a passagem e para quem era endereçada?
O que a passagem diz?
Existe alguma palavra ou frase nesta passagem que precise ser examinada?
Qual é o contexto imediato?
Qual é o contexto mais amplo exposto no capítulo e no livro?
Quais são os versículos relacionados ao assunto da passagem e como eles afetam a compreensão desta?
Qual é o fundo histórico e cultural?
Qual a conclusão que eu posso tirar desta passagem?
As minhas conclusões concordam ou discordam de áreas relacionadas nas Escrituras ou com outras pessoas que já estudaram esta passagem?
O que eu posso aprender e aplicar à minha vida?
A fim de ajudar a entender como estas questões podem afetar a sua interpretação de uma passagem, eu escolhi uma que, quando examinada atentamente, pode fazer você chegar a conclusões muito diferentes. Eu deixarei que você determine a exatidão da minha interpretação. A passagem que eu vou usar é Mt 24:40, "Dois homens estarão no campo; um será levado e o outro será deixado" (NIV).
1. Quem escreveu/falou a passagem e para quem era endereçada? Jesus pronunciou as palavras e elas foram registradas por Mateus. Jesus falou aos Seus discípulos em resposta a uma pergunta, que iremos ver mais tarde.
2. O que a passagem diz? A passagem diz simplesmente que um dos dois homens que estão fora, no campo, será levado. Ela não diz onde, porque, quando, ou como. Ela só diz que um será levado. Ela não define que o campo pertença a alguém ou a algum lugar em particular.
3. Existe alguma palavra ou frase nesta passagem que precise ser examinada? Nenhuma palavra, nesta passagem em particular, realmente necessita que nós a examinemos cuidadosamente, mas para seguirmos este exercício, eu usarei a palavra "levar". Usando uma Concordância de Strong e um Dicionário de Palavras do Novo Testamento, eu posso verificar qual é a palavra grega e aprender a respeito dela. A palavra no Grego é "paralambano". Ela significa: "1) tomar, tomar para si mesmo, trazer para junto de si, 2) receber alguma coisa por transmissão." Um ponto que vale a pena mencionar acerca do estudo das palavras é que o seu significado pode mudar de acordo com o seu contexto. Assim, examinando como a palavra é usada em múltiplos contextos, o seu significado pode reveber novas dimensões. Por exemplo, a palavra "amor", no grego é "agapao." Ela geralmente refere-se ao "amor divino." Isto pode parecer óbvio, já que esta é a palavra usada em Jo 3:16 com este significado. No entanto, a mesma palavra é usada em Lc 11:43, onde Jesus diz: "Ai de vocês, fariseus, porque amam os lugares de honra nas sinagogas e as saudações em público!" (NIV). A palavra usada aqui é "agapao." Parece que o significado da palavra pode tornar-se alguma coisa na linha de "totalmente comprometido com." No entanto, nós devemos tomar o cuidade de não usar o significado de uma palavra em um contexto em outro contexto. Por exemplo: 1) Este novo cadete é verde. 2) A árvore é verde. O primeiro verde significa "novo ou inexperiente." O segundo significa a cor verde. Poderíamos impor o significado de um contexto em outro? Sim, mas não seria uma boa idéia.
4. Qual é o contexto imediato? É o lugar onde a passagem está inserida. O contexto imediato da nossa passagem é o seguinte, Mt 24:37-42, "Como foi nos dias deNoé, assim também será na vinda do Filho do Homem. 38 Pois nos dias anteriores ao dilúvio, o povo vivia comendo e bebendo, casando-se e dando-se em casamento, até o dia em que Noé entrou na arca; 39 e eles nada perceberam, até que veio o dilúvio e os levou a todos. Assim acontecerá na vinda do Filho do Homem. 40 Dois homens estarão no campo: um será levado e o outro será deixado. 41Duas mulheres estarão moendo num moinho: uma será levada e a outra deixada. 42 Portanto, vigiem, porque vocês não sabem em que dia virá o seu Senhor" (NIV). Imediatamente podemos perceber que a pessoa levada no verso 40 é comparada a pessoa levada no verso 39. Isto é, que as pessoas que foram "levadas" são do mesmo tipo. Uma pequena questão precisa ser feita agora. Quem foi levado no verso 39? Foi Noé e sua família ou foram as pessoas que estavam comendo e bebendo? A resposta a esta pergunta pode nos ajudar a entender melhor a passagem original. O próximo passo na interpretação da passagem nos ajudará a entendê-la ainda mais.
5. Qual é o contexto mais amplo exposto no capítulo e no livro? Uma passagem deve ser sempre examinada dentro do seu contexto. Não apenas no contexto dos versos imediatamente antes e depois dela, mas também no contexto do capítulo e até do livro na qual ela está escrita. O discurso de Jesus do qual esta passagem foi tirada, começa com uma pergunta. Jesus tinha acabado de sair do templo e no verso 2 disse aos Seus discípulos que "..não ficará aqui pedra sobre pedra; serão todas derrubadas." Então no versículo 3, os discípulos perguntam a Jesus: "Dize-nos quando acontecerão essas coisas? E qual será o sinal da sua vinda e do fim dos tempos?" (NIV). Então, Jesus começa a profetizar acerca das coisas que viriam no fim dos tempos. Ele falou de falsos Cristos, tribulação, do sol se escurecendo, do Seu retorno e dos dois homens no campo onde um será levado e outro será deixado. O contexto é escatológico. Isto signiufica que ele está tratando das últimas coisas, ou do tempo próximo ao retorno de Jesus. Muitas pessoas acham que este versículo de Mt 24:40 refere-se ao arrebatamento mencionado em 1 Ts 4:16-17. Pode ser. Mas é interessante notar que o contexto do versículo sugere que o mau é que será levado, e não o bom. Neste momento você pode estar pensando que este método de interpretação da passagem não é bom. Depois de tudo, o verso "um será levado e o outro deixado" é realmente acerca do arrebatamento. Certo? Bem, pode ser. Como você pode ver, nós todos chegamos à Bíblia com idéias pré-concebidas. Algumas vezes elas estão certas, outras, erradas. Nós sempre deveríamos estar prontos a ter a nossa compreensão da Bíblia desafiada pelo que é dito. Se nós não estivermos dispostos, então somos presunçosos. E Deus está distante do soberbo (Sl 138:6).
6. Quais são os versículos relacionados ao assunto da passagem e como eles afetam a compreensão desta? Acontece que existe uma passagem relacionada, na verdade, paralela, encontrada em Lc 17:26-27. "Assim como foi nos dias de Noé, também será nos dias do Filho do Homem. 27O povo estava comendo, bebendo, casando-se e sendo dado em casamento, até o dia em que Noé entrou na arca. Então veio o dilúvio e destruiu a todos." (NIV). Rapidamente, nós descobrimos que estes versos relacionados sem dúvida afetam a nossa maneira de entender a passagem inicial. Está claro nesta passagem de Lucas que aqueles que foram levados pelo dilúvio eram aqueles que estavam comendo, bebendo e se dando em casamento . Em outras palavras, não foram as pessoas boas que foram levadas, foram as más. Como você pode ver, isto tem um profundo impacto na maneira como compreendemos nossa passagem em Mt 24:40. O contexto não sugere que aquele que está no campo que será levado não é o mau? Como este contexto afeta as minhas idéias pré-concebidas acerca deste verso? Vamos ler o versículo novamente, mas agora dentro do seu contexto imediato: Mateus 24:37-42, "Como foi nos dias deNoé, assim também será na vinda do Filho do Homem. 38 Pois nos dias anteriores ao dilúvio, o povo vivia comendo e bebendo, casando-se e dando-se em casamento, até o dia em que Noé entrou na arca; 39 e eles nada perceberam, até que veio o dilúvio e os levou a todos. Assim acontecerá na vinda do Filho do Homem. 40 Dois homens estarão no campo: um será levado e o outro será deixado. 41Duas mulheres estarão moendo num moinho: uma será levada e a outra deixada. 42 Portanto, vigiem, porque vocês não sabem em que dia virá o seu Senhor" (NIV). O que é que você acha agora? Quem foi levado, o bom ou o mau? Então, este verso faz referência ao arrebatamento ou não? Só perguntando. De interesse correlato é uma passagem em Mt 13:24-30 onde Jesus conta a parábola do semeador que semeou a boa semente no seu campo e alguém, depois, semeou joio. Os servos perguntaram se eles deveriam ir imediatamente e arrancar o joio. Mas, no verso 30, Jesus diz "Deixem que cresçam juntos até a colheita. Então direi aos encarregados da colheita: juntem primeiro o joio e amarrem-no em feixes para ser queimado; depois juntem o trigo e guardem-no no meu celeiro." (NIV) O ponto digno de nota aqui é que o primeiro a ser ajuntado é o joio, e não o trigo. Isto fica ainda mais interessante quando Jesus explica a parábola em Mt 13:36-43 e estabelece que eles serão atirados à fornalha. Adicionalmente, quando nos voltamos para Lc 17, que é a passagem paralela de Mt 24, nós descobrimos que os discípulos fizeram a Jesus outra pergunta por causa da resposta de Jesus que dizia "dois estarão no campo e um será levado." No verso 37 eles perguntam, "Onde, Senhor?" perguntaram eles. Ele [Jesus] respondeu, "Onde houver um cadáver; ali se ajuntarão os abutres." Eles serão levados a um lugar de morte.
7. Qual é o fundo histórico e cultural?Esta é uma questão mais difícil de responder. Ela requer um pouco mais de pesquisa. Um comentário é digno de ser examinado aqui, já que ele usualmente provê um pano de fundo histórico e cultural para ajudar a desvendar o texto. Neste contexto, Israel estava debaixo da lei romana. Eles estavam proibidos de exercer a punição capital (pena de morte) e de custear uma guerra. Roma estava dominando a pequena nação. O judaísmo era tolerado apesar da liderança romana. Além de tudo, Israel era um pequeno país oriental com um povo que era fanático pela sua religião. Então, Roma permitiu que Israel fosse governado por políticos judeus marionetes. O templo era o lugar de adoração da comunidade israelense. Ali os sacrifícios de sangue eram oferecidos pelo sumo sacerdote para a expiação dos pecados da nação. Levaram 46 anos para contruí-lo (Jo 2:20). Jesus disse que o templo seria destruído; o que gerou a pergunta que O levou a fazer o discurso que contém a passagem examinada.
8. Qual a conclusão que eu posso tirar desta passagem? Desde que o contexto da passagem sugere que o mau é que será levado, eu estou concluindo que aquele que será levado no campo não será o bom, mas sim o mau. Eu também sou tentado a concluir que o maus serão levados ao lugar de julgamento.
9. As minhas conclusões concordam ou discordam de áreas relacionadas nas Escrituras ou com outras pessoas que já estudaram a esta passagem? Eu já apresentei outras passagens que me permitem chegar a conclusão que cheguei. No entanto, isto não está de acordo com todos os comentários que eu tenho lido acerca deste verso. Neste ponto eu necessito apresentar minha conclusão a outros para ver o que eles pensam. Só porque eu estudei a Palavra e cheguei a uma conclusão não significa que ela esteja correta. Mas não significa que esteja errada, no entanto. Consultar outras pessoas, examinar a palavra de novo e buscar a Deus humildemente e a sua iluminação. Eu só posso ter a esperança de chegar à melhor conclusão possível acerca da passagem.
10. O que eu posso aprender e aplicar à minha vida? A Interpretação da Escritura tem um propósito: Entender a Palavra de Deus mais exatamente. Com um melhor entendimento da Sua palavra, nós poderemos aplicá-la à área a que ela se destina. No nosso caso, a passagem revela uma área do futuro e uma época de julgamento. A aplicação, então, é que Deus executará o julgamento sobre os injustos no fim dos tempos.
Concluindo:
Este artigo é somente uma demonstração. Ele é básico e não cobre todos os pontos da interpretação bíblica. Mas isto já dá uma direção e um exemplo de como você deve aplicar. Como eu disse antes, ore. Leia a Sua Palavra. Examine as Escrituras o melhor que você puder para um melhor entendimento e melhor preparo. Seja humilde na sua abordagem e teste tudo o que concluir pela própria Bíblia.
http://www.carm.org/

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Filosofia
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

Filosofia (do grego Φιλοσοφία: philos -
amor, amizade + sophia - sabedoria) modernamente é uma disciplina, ou uma área de estudos, que envolve a investigação, análise, discussão, formação e reflexão de idéias (ou visões de mundo) em uma situação geral, abstrata ou fundamental. Originou-se da inquietação gerada pela curiosidade humana em compreender e questionar os valores e as interpretações comumente aceitas sobre a sua própria realidade. As interpretações comumente aceitas pelo homem constituem inicialmente o embasamento de todo o conhecimento. Estas interpretações foram adquiridas, enriquecidas e repassadas de geração em geração. Ocorreram inicialmente através da observação dos fenômenos naturais e sofreram influência das relações humanas estabelecidas até a formação da sociedade, isto em conformidade com os padrões de comportamentos éticos ou morais tidos como aceitáveis em determinada época por um determinado grupo ou determinada relação humana. A partir da Filosofia surge a Ciência, pois o Homem reorganiza as inquietações que assolam o campo das idéias e utiliza-se de experimentos para interagir com a sua própria realidade. Assim a partir da inquietação, o homem através de instrumentos e procedimentos equaciona o campo das hipóteses e exercita a razão. São organizados os padrões de pensamentos que formulam as diversas teorias agregadas ao conhecimento humano. Contudo o conhecimento científico por sua própria natureza torna-se suscetível às descobertas de novas ferramentas ou instrumentos que aprimoraram o campo da sua observação e manipulação, o que em última análise, implica tanto na ampliação, quanto no questionamento de tais conhecimentos. Neste contexto a filosofia surge como "a mãe de todas as ciências".
Podemos resumir que a filosofia consiste no estudo das característica mais gerais e abstratas do mundo e das categorias com que pensamos: Mente (pensar), matéria (o que sensibiliza noções como quente ou frio sobre o realismo), razão(lógica), demostração e verdade. Pensamento vem da palavra Epistemologia "Epistemo" significa "ter Ciência" "logia" significa Estudo. Didaticamente, a Filosofia divide-se em:
Lógica: trata da preservação da verdade e dos modos de se evitar a inferência e raciocínio inválidos.
Metafísica ou ontologia: trata da realidade, do ser e do nada.
Epistemologia ou teoria do conhecimento: trata da crença, da justificação e do conhecimento.
Ética: trata do certo e do errado, do bem e do mal.
Filosofia da Arte ou Estética: trata do belo.
Definições dos Filósofos sobre a Filosofia
Em "Eutidemo" de Platão, é o uso do saber em proveito do homem, o que implica em, 1º, posse de um conhecimento que seja o mais amplo e mais válido possível, e , 2º , o uso desse conhecimento em benefício do homem.
Para René Descartes, significa o estudo da sabedoria.
Para Thomas Hobbes, é o conhecimento causal e a utilização desse em benefício do homem.
Para Immanuel Kant, é ciência da relação do conhecimento à finalidade essencial da razão humana, que é a felicidade universal; portanto, a Filosofia relaciona tudo com a sabedoria, mas através da ciência.
Para John Dewey, é a crítica dos valores, das crenças, das instituições, dos costumes, das políticas, no que se refere seu alcance sobre os bens ("Experience and Nature", p. 407).
Para Johann Gottlieb Fichte, é a ciência da ciência em geral.
Para Auguste Comte, é a ciência universal que deve unificar num sistema coerente os conhecimentos universais fornecidos pelas ciências particulares.
Concepções de Filosofia
Há três formas de se conceber a Filosofia:
1º) Metafísica: a Filosofia é o único saber possível, as demais ciências são parte dela. Dominou na Antiguidade e Idade Média. Sua característica principal é a negação de que qualquer investigação autônoma fora da Filosofia com validade, produzindo estas um saber imperfeito, provisório. Um conhecimento é filosofico ou não é conhecimento. Desse modo, o único saber verdadeiro é o filosófico, cabendo às demais ciências o trabalho braçal de garimpar o material sobre o qual a Filosofia trabalhará, constituindo não um saber, mas um conjunto de expedientes práticos. Hegel afirmou: “uma coisa são o processo de origem e os trabalhos preparatórios de uma ciência e outra coisa é a própria ciência.”
2º) Positivista: o conhecimento cabe às ciências, à Filosofia cabe coordenar e unificar seus resultados. Bacon atribui à Filosofia o papel de ciência universal e mãe das outras ciências. Todo o iluminismo participou do conceito de Filosofia como conhecimento científico.
3º) Crítica: a Filosofia é juízo sobre a ciência e não conhecimento de objetos, sua tarefa é verificar a validade do saber, determinando seus limites, condições e possibilidades efetivas. Segundo essa concepção, a Filosofia não aumenta a quantidade do saber, portanto, não pode ser chamada propriamente de “conhecimento”.

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Chamado radical

Bráulia Ribeiro Começamos a caminhada para dentro da mata, no dia seguinte à partida do barco da dona Dôca. Enfrentando a ameaça das cobras e onças, subimos pirambeiras e atravessamos lodaçais. A mata escura e úmida nos ameaçava. Eustáquio não conseguia matar bicho algum, nem deixava Deni matar, porque ele, como o homem principal da expedição, tinha de segurar a única espingarda velha que tínhamos. Assim, a comida foi acabando e, se não fosse um jabuti que a Telma achou, teríamos passado fome. Lá pelo fim do quarto dia de caminhada, chegamos a uma maloca abandonada. Era linda, alta e bem feita. Parecia coisa de filme. Eu me beliscava para ter certeza de que não estava sonhando. Depois de quatro dias na mata sombria, a maloca parecia uma sofisticada ilha de civilização, uma verdadeira Manhattan. A casa comunitária era alta como um arranha-céu. Dentro havia pedaços de tecnologia jogados pelo chão, flechas, panelas de barro bem guardadinhas debaixo de folhas, e ao redor havia plantações. Dormimos ali, na expectativa do que encontraríamos no dia seguinte. A noite passou devagar. Imaginávamos mil coisas: “E se eles tiverem fugido ao saber que viríamos? Nossa aproximação pela mata deve ter sido para eles como a aproximação de uma frente de exército... E se nunca mais os encontrarmos? E se eles chegarem sorrateiramente e nos capturarem? E se nos estuprarem? E se...?” Acordamos cedo e, como animais urbanos, descemos para o igarapé com escova de dentes, sabonete e toalha de rosto nas mãos para a higiene matinal que acabou sendo a última de muitas semanas. De repente, enquanto escovávamos os dentes, fomos cercados por índios selvagens pintados de vermelho com arcos e flechas em punho. Primeiro um grandalhão desceu com uma criança e gritou para os outros atrás dele. Olhei para ele espantada, achando-o lindo. Estava nu, pintado da cabeça aos pés de um vermelho forte. O cabelo era bem cortado em forma de cuia com um caminhozinho logo acima das orelhas. Tinha brincos de madeira no lóbulo das orelhas e dentes bonitos e limpos. Falava sem parar, ora parecendo bravo, ora alegre. Eu não temia mais nada. O medo deu lugar a uma forte certeza do amor de Deus por nós. Logo chegaram os outros e nos cercaram, certamente querendo saber do que se tratava aquela visita. Percebemos que eles queriam saber o que havíamos levado e logo comecei a latir, tentando anunciar o pobre cachorro que acompanhava a Telma. Havíamos decidido não levar presentes. Depois da minha experiência entre os Paumari do Tapauá concluí que agir com paternalismo cria uma relação patrão–empregado que compromete o sucesso do trabalho missionário... (Trecho do livro Chamado Radical, lançamento da Editora Ultimato)